Atropelei um passarinho
Pacotinhos de Noção
Ia na A5, no sentido Lisboa - Cascais, e quase a chegar às portagens de S.Domingos de Rana um pássaro bateu-me no pára-brisas. O vidro não estalou mas sei que o pássaro morreu. Pela força da batida tenho a certeza que o pardal não se safou.
Isto aconteceu-me há 14 anos. Não é um trauma mas de alguma forma há-de me ter marcado, porque recordo o episódio com clareza até hoje.
Não me senti um cabrão, mas também não me senti um Cabrita.
Não sei o grau de sentimento de culpa do senhor Cabrita. Sei que do tipo que estava a trabalhar a culpa é total, ou pelo menos o comunicado que o MAI emitiu assim o dá a entender, pois os trabalhos não estavam sinalizados, o senhor estava a jogar à macaca no meio da auto-estrada e até tinha a alcunha de "Pombinho", por isso era mais que certo que poderia vir a ter o triste fim que teve o pardal a quem ceifei a vida.
A humanidade não é flor que se cheire mas quando ganham lugares de elementos governativos então fedem que se fartam. Séculos de história estão ai para o provar, mas mesmo sabendo isto, parece-me vergonhoso, obsceno e amoral demais que depois de tanta incompetência de um Ministro, cujos pedidos de demissão se vão acumulando de dia para dia, o mesmo continue em funções, tenha o apoio do Primeiro-Ministro e que o Presidente se feche em copas no que a esta personagem diz respeito.
Dir-me-ão que foi uma fatalidade... Estou de acordo, foi uma fatalidade, poderia acontecer a qualquer um, o que não é fatalidade é tudo aquilo que aconteceu depois.
Estes joguinhos de poder e protecção, esta máfia engravatada que corrompe o nosso dia-a-dia afirmando que nos governa, está só a governar-se a si mesmo.
O que aconteceu no SEF, se não tivesse saído cá para fora, tinha ficado por isso mesmo. Mas foi divulgado e a viúva do cidadão ucraniano ficou sem marido, sem sustento mas como a crítica internacional teve conhecimento do caso, teve que se calar a senhora com perto de 850 mil euros.
A mulher deste trabalhador não tem a crítica internacional do seu lado. Tem pouca da nacional, porque na altura em que o marido morreu, a crítica até estava mais preocupada com os jogos da selecção, e tem também um Ministério da Administração Interna cujo "patrão" é o tipo que lhe atropelou o marido, e que no lugar de lhe valer, só vai complicar mais as coisas. Isto parece até daqueles filmes em que por mais que o herói se tente safar, a areia movediça da máfia que o persegue é tal, e tem tantas ramificações no poder, que a única coisa que lhe resta fazer é dar-se à morte.
A BRISA já veio desmentir o MAI. A obra estava sinalizada, como aliás é apanágio da empresa em todos os seus trabalhos. Já o MAI não indica os níveis dos testes de alcoolemia, não dá a conhecer a velocidade a que seguia o carro e tentam apenas proteger um Ministro que de tão incompetente e arrogante, levou à morte de uma pessoa.
Mas isto não é caso único. Se bem se recordam, no Verão de 2017 deu-se o incêndio de Pedrogão e morreram pessoas.
O Primeiro-Ministro e o Presidente afirmaram que tal não podia tornar a acontecer... Em Outubro, e porque a época de incêndios supostamente já havia acabado, houve novos incêndios mas não havia os meios indicados para os combater. Morreram mais pessoas. Quem foi responsabilizado? NINGUÉM. A única medida que se tomou foi a obrigatoriedade da limpeza das matas, sob pena de se passar elevadas multas aos proprietários dos terrenos. Importa referir que os terrenos do Estado não servem de exemplo e poucos são limpos.
A empresa para quem Nuno Santos "Pombinho" trabalhava cobriu as custas do funeral. Não o devia ter feito. O Governo, do qual faz parte o elemento que custou a vida a esta pessoa, deveria ter olhado a esta despesa e a muitas outras que advém desta morte. Se os filhos de Ihor Homeniuk têm direito a uma pensão enquanto estiverem a estudar, e a viúva a uma indemnização, então também as filhas e a mulher de Nuno Santos deveriam ter. Os casos são diferentes apenas porque um está a ser abafado e o outro não foi.
Ainda se vai chegar à conclusão de que a culpa é só do motorista, que apenas teve que cumprir ordens, mas como se sabe a corda parte sempre para o lado mais fraco.
Eu matei um pardal e senti-me mal, o Cabrita foi responsável pela morte de um homem, mas não tirou o rabo do carro.