Se ainda existissem videoclubes o filme Beleza Americana (American Beauty, para os "tugas" cuja primeira língua é o inglês) estaria escondido lá mesmo no fundo da loja, bem depois dos filmes para maiores de 18 e até dos portugueses "Mustang" e "Amo-te Teresa". Primeiro por causa de todo o burburinho em volta do Kevin Spacey, depois porque tem aquela mítica cena do saco de plástico esvoaçante, que hoje seria impensável e poderia até levar ao cancelamento do filme. Proibição não, que não vivemos em ditaduras, apenas cancelamento.
Era eu miúdo, ali pelos anos 90, e a luta era a favor do plástico. Tinhamos que usar plástico em vez de madeira. As árvores dão-nos o oxigénio e o desmatamento avançava a galope. O papel também tinha que ser evitado ao máximo. Quase que deixou de haver embalagens de papel, passou tudo a ser de plástico, os americanos eram umas bestas porque só usavam sacos de papel e até os testes na escola eram feitos numas folhas recicladas acastanhadas. Nas escolas havia a recolha de papel, que geralmente ficava em contentores à espera que os viessem buscar o ano inteiro. Parecia o Banco Alimentar, mas para o papel.
Ao que parece as árvores, essas bestas, têm vindo a proliferar pois agora os talheres de plástico passaram a madeira, as palhinhas são de papel e um tipo que vá buscar um take away a um restaurante, ou bem que leva uma marmita para a comida ou tem que comer a caixa de plástico, para ser sustentável.
Bem sei que há-de existir alguém a dizer que o plástico é um mal para o Mundo e para toda a Humanidade.
É um mal por agora, mas este agora vai demorar quanto tempo, conseguirão responder-me? Não conseguindo é fazer o favor de se montarem nas vossas sustentáveis trotinetes eléctricas, cheias de plástico, e podem ir andando.
Não quero parecer agressivo, na verdade a sugestão de vos pedir para irem andando foi apenas para poder introduzir a piada/alfinetada da trotinete, mas começa a incomodar-me que tanta gente que fuma e lança as suas beatas para o chão, me aponte o dedo por causa de um saco de plástico que, vos posso garantir, nunca atirei ao mar. Assim como nunca cuspi para o chão nem tentei dar asas a uma máscara.
Estas modas e proibições fazem-me sempre lembrar os vegetarianos que tem os seus cintos e botas de cabedal, ou cujos carros têm estofos em pele. Ou aqueles que criticam a "pegada ecológica" de todo e qualquer um, mas que têm como passatempo viajar e por mais que eu pise, a minha pegada ecológica nunca vai ser tão grande como a deles, porque o consumo de combustível dos aviões que eles apanham para os seus passatempos não faz pegada na ecologia, calca-a.
Posso elaborar mil teorias e dizer que isto é o "lobby" das madeireiras a tentar criar lucro próprio, com a conivência dos vários Estados, mas na verdade acho que não. Mais uma vez acho que, na falta de melhor, existe uma franja da população que quer à viva força impor as suas vontades, e como é uma minoria acabam por depois conseguir agregar uma grande maioria de
pessoas sem personalidade que, na falta de guia espiritual, escolhem uma causa como guru.
A partir de agora serei considerado um marginal, de cada vez que pedir um saco seja onde for. Se estiver na fila da farmácia e pedir um saco, vão existir mais olhares reprovadores do que aqueles que existiram para o toxicodependente que passou à frente de todos para ir buscar seringas gratuitamente. Dirão que ele está a tratar-se mal a ele e eu a tratar mal o ambiente. Depende da perspectiva, pois senão vejam:
- Comprei um saco de plástico e tenho o hábito de o reutilizar. Mesmo que seja para utilizar como saco do lixo sei que aquele saco vai ter uma percentagem de reutilização. Essa reciclagem vai criar gases comburentes que serão lançados para a atmosfera, mas e na reciclagem do papel, nas várias lavagens químicas do material, não há problema? E na produção de papel, no fabrico da pasta de celulose, os químicos utilizados são inócuos? Sinceramente não sei.
- No caso do toxicodependente a humanidade também sofrerá. Reparem que as seringas não são para injectar penicilina no rabinho. Não se espantem mas a verdade é que ele se vai drogar. Com que dinheiro comprou a droga? Terá roubado alguém, roubado a reforma da mãe? Se calhar não, provavelmente trabalha e ganha o seu ordenado, mas ainda assim comprou droga e daquilo que sei a droga não se vende em supermercados. Tem que se contactar com gente que comete crimes e cuja produção dos estupefacientes utilizou trabalho escravo e muitas vezes infantil...
Como se vê é apenas uma questão de perspectiva e basta também usar um bocadinho de populismo, admito, mas não inventei nada do que disse.
Aproveito e acrescento também que mais uma vez o Estado faz dos portugueses gato-sapato. Entrou em vigor uma lei em que em qualquer estabelecimento comercial não pode oferecer o saco, seja ele de plástico, papel, cartão, crochet. O cliente terá que o pagar pois a oferta é proibida... Ia dizer "proibida não, cancelada", mas aqui o proibido é mesmo a palavra correcta. Esta lei serve apenas para gerar riqueza para o estado. Cada saco tem o seu IVA, e o IVA do plástico é tão bom quanto o do papel.