A Rapariga da Fotografia (SPOILER ALERT)
Pacotinhos de Noção
Vi hoje o documentário da Netflix, "A Rapariga da Fotografia".
Um documentário de quase duas horas que nos mostra que Hollywood ainda não conseguiu inventar nada que se possa assemelhar com a realidade.
No fim destas quase duas horas de documentário posso dizer que sinto mais pobre anímicamente do que antes de o ver, e isto porque a minha percepção do quão horroroso pode ser o Homem, ficou mais apurada.
A história, real, começa com o atropelamento de uma rapariga de cerca de 20 anos, que acaba por falecer.
Dão-nos os dados principais e começamos logo o nosso julgamentozinho.
Uma miúda jovem, bonita, com um relacionamento com um homem mais velho, de quem tem um filho de 6 anos e que, ainda assim, trabalha em bares de strip.
Isto são os primeiros dados e não criamos grande empatia com esta rapariga, mas depois começam a surgir os relatos de quem a conhecia.
Tudo bem que já está morta e dos mortos só se fala bem, mas quem dava o seu depoimento mostrava real tristeza, e dá par perceber que sentem a falta daquela pessoa.
O que é um facto é que tanto as amigas, como enfermeiros do hospital onde a rapariga faleceria, perceberam que algo de estranho se tinha passado e avisaram as autoridades, autoridades essas que ao pegar no caso descobriram que o nome dado pelo marido era falso.
Isto é só a ponta do véu e dá para ficarmos maravilhados ao perceber como o FBI, com apenas algumas migalhas, conseguiu chegar a algumas conclusões acertadas.
Não vos vou contar mais, vou só deixar-vos os ingredientes principais e mais aterradores, mesmo sendo spoiler. Depois cada um decide se vê o documentário ou não.
O marido que a levou para o hospital, e que se crê que tenha sido quem provocou a sua morte, era afinal o seu pai, que era afinal o seu violador, e que era afinal o seu padrasto raptor, desde quando esta menina tinha uns 5/6 anos.
Anos de tortura psicológica fizeram com que a rapariga fosse um boneco nas mãos deste homem, fazendo tudo o que ele lhe mandava, incluindo prostituir-se.
Mais tarde a rapariga engravidou e teve um menino chamado Michael. O Michael passou a ser mais uma forma de chantagem para este homem.
Depois da morte da rapariga, o Michael foi entregue a uma família de acolhimento, e veio a provar-se que ele não era filho do monstro que lhe torturava a mãe.
Ainda assim, este bandido, foi a escola da criança, com uma arma, e raptou Michael.
Mais tarde confessou que poucas horas depois matou o menino de 6 anos, com 2 tiros na nuca, fazendo desaparecer o corpo.
Temos já duas mortes nas costas desta coisa, que não é humana, mas o FBI deu, entretanto, com mais um cadáver de alguém, que se veio a descobrir então, ser uma amiga/colega da rapariga, que trabalhava no mesmo bar de strip que ela. Levou dois tiros na nuca, e é esta descoberta que faz com que este tipo seja condenado à pena de morte.
Mas como tudo isto se despoletou?
Basicamente foi devido a uma mãe que tinha demasiado energia entre-pernas, desculpem-me a expressão.
Suzanne Marie Sevakis, a tal rapariga atropelada, só veio a ter o seu verdadeiro nome revelado já após a sua morte. Tinha sido Sharon, tinha sido Tonya, já tinha usado mais uma série de nomes.
Foi a primeira filha de um casamento de dois jovens, Sandra e Cliff.
O casal vivia feliz, mas Cliff teve que ir para a guerra do Vietname.
Sandra não aguentou esperar, e quando Cliff voltou a sua mulher já estava casada com outro homem, e com mais dois filhos desse relacionamento. Mais tarde haveria de ter outra criança, mas acabaria por se separar também desse marido.
Vai morar para um parque de caravanas que acaba por ser fustigado por um tornado, fazendo Sandra perder até a casa. As crianças acabam por ser sinalizadas pela Segurança Social. Numa visita à igreja, onde Sandra chora, talvez com pena de si própria, surge um cavalheiro que lhe pergunta o motivo de estar assim. Depois de ela contar-lhe, ele propõe que se casem, para não perder os filhos... Ela aceita.
Para mostrar como os passos desta mãe de família são certos, acaba por ser apanhada pela polícia, por passar cheques falsos. Fica presa cerca de 1 mês, e quando volta cá para fora constata que os seus filhos desapareceram. Hoje sabemos que três foram institucionalizados e a Suzzane foi raptada pelo seu padrasto, e usada como mulher dele, ainda enquanto criança.
O que esta mãe fez, como qualquer mãe faria, foi correr meio Mundo, falar com todas as instituições possíveis e imaginárias para que a ajudassem a encontrar os filhos, certo? Errado.
Foi à esquadra mais próxima e quando lhe disseram que não podiam fazer nada porque o raptor era seu marido, ela encolheu os braços, e segue como se nada tivesse acontecido.
O descaso desta "mãe", deu origem a 20 anos de sofrimento da filha que, imaginem só, mesmo com estes problemas todos passou pela vida de várias pessoas, marcando-as positivamente. Conseguiu ainda uma bolsa de estudo, paga a 100% para ir para a universidade, coisa que acabou por não acontecer, ao ter engravidado, e ter saído da cidade em que estava.
Originou o assassinato do neto, que nem conheceu, e ainda bem para o neto, porque seria alguém que não acrescentaria nada de novo na curta vida do menino.
Nesta história toda há muitas coisas perturbadoras. Não quero imaginar o sofrimento da menina, durante quase todos os seus 20 anos. O medo e o desespero do menino que, havia perdido a sua mãe recentemente, e a quem era tão ligado, e que acabaria por morrer às mãos do padrasto.
É também muito perturbador que no meio de tanta morte, esta mãe, embora velha e debilitada, ainda esteja viva, e que o assassino, violador, embora tenha apanhado pena de morte, ainda esteja hoje vivo também... Preso, mas vivo, e um dia pode ser até que veja a sua pena mudada, caso se proíba a pena de morte na Florida.