Caldeirão de polémicas
Pacotinhos de Noção
O último texto que escrevi, acerca do assassinato da Jéssica, levantou algumas questões na área de comentários do Instagram, que nos blogs da Sapo, infelizmente, a afluência é menor e são bem menos participativos.
Num comentário de resposta, defendi que o Estado deveria intervir quando, num caso como a mãe da Jéssica, que já teve 6 filhas, 5 institucionalizadas e uma morta, e em que há hipótese de gerar mais crianças, deveria ser obrigada a fazer uma laqueação de trompas, assim como o pai, que também teria que fazer uma vasectomia.
É uma violência? Um atentado à liberdade destas pessoas? Penso que não. São medidas necessárias para controlar alguém que não tem a mínima capacidade para ser mãe ou pai, tendo em consideração que ser pais não é só fazê-los e pari-los. Ser pais é amar, educar, proteger, e segundo consta nada disto foi feito pelos da Jéssica.
E como eles, há milhares de casos, e aposto que cada um que lê estas palavras conhece pelo menos um ou dois, porque é realmente muito comum crianças nascendo em famílias onde não têm amor e atenção, deixadas ao abandono numa criação quase autorregulada, ou feita pelas creches e infantários para onde vão, mesmo quando os pais ficam em casa, sem trabalhar.
Um traço comum de distanciamento é que estas crianças parecem nem ter nome. Até aos 3/4 anos os pais referem-se ao filho como "o bebé", e não é um bebé dito de forma carinhosa, é dito de uma forma sonolenta e arrastada, dando mesmo a ideia de que não se lembram do nome do bicho. Depois dos 4 até aos 6 anos, já passa a ser o "manino". Escrevi como dizem, porque menino não parece constar nos seus dicionários. Após entrarem para a escola primária já passa a ser o "puto ou a princesa". Os anos passam e nunca utilizam o nome dos filhos, revelando o tal distanciamento, bastante acentuado, que referi.
Reparem que para estas pessoas os filhos valem pela gravidez, pois há um subsídio e dá para passar à frente nas filas, e depois valem também pelo abono. Ainda no outro dia ouvi uma conversa telefónica de um destes pais amorosos, que dizia que "deste bebé que temos agora, para receber o subsídio, temos que pagar 60 paus que temos de dívida na Segurança Social". Para quem viu as notícias da Jéssica, o estilo do artista que falava assim ao telefone era igual ao pai da Jéssica, com boné de "runa" e tudo.
Os comentários são como as cerejas, um leva a outro, e um companheiro que me lê, mas que não concorda com esta minha opinião, afirma que o Estado não pode ter este poder sobre os cidadãos, assim como não será admissível haver pena de morte. E cá está outra polémica, a pena de morte.
Tanto a laqueação das trompas, como a pena de morte, não considero que sejam poderes do Estado, e sim ferramentas para o controlo de elementos que vivem à parte da sociedade, não respeitando o próximo, colocando-o em perigo, e até muitas vezes matando-o. Quando digo que defendo a pena de morte, defendo-a como uma pena de excepção, que só poderia ser aplicada em casos de violação e homicídio de menores, homicídios em série, em massa e por motivos fúteis, e isto tudo quando apanhado em flagrante, ou claramente comprovado.
Isto que defendo é bonito e consensual? Não, sei que não o é, mas no meio de tanta facilidade que hoje em dia existe em matar, custa-me imenso que seja cada vez mais difícil punir, e que as vítimas não tenham tido direito a defesa, mas que os homicidas, mesmo os confessos, tenham sempre direito à sua defesa por parte de alguém que defende que o direito à vida é o valor maior, ignorando que aquele que defende, não teve pudor em retirar esse direito a alguém.
Compreendo que as pessoas tenham os seus pontos de vista e que os queiram defender, mas não é tudo linear, nem a preto ou a branco. Defender que o Estado não pode legislar isto ou aquilo, alegando que não faz parte das suas funções, é estar a defender o indefensável. Diariamente temos regras a respeitar, sejam elas quais forem, e quase todas impostas pelo Estado. Não podemos ter fé na consciência de cada um, porque se não existissem regras é um facto que viveríamos no meio de uma bandalheira, porque há sempre quem aproveite para ir um pouco mais além daquilo que é permitido. Mal comparado é como se querer fazer uma marquise no topo de um condomínio de luxo. Não lembra a ninguém, mas pode sempre haver alguém que tente.
É também por isso que a questão do aborto não é apenas sim ou não, e escusam de vir com a questão do "meu corpo, a minha decisão". Quando há uma gravidez, foram preciso dois para que essa gravidez acontecesse, e raramente a voz do homem é tida em consideração, para saber se a gestação avança ou não. Sim, é verdade que, pelo menos durante 9 meses, será a mulher a carregar um fardo que pode nem querer, mas havendo um dos intervenientes a querer a criança, neste caso o pai, que remédio terá a mulher senão o de ter que levar a gravidez até ao fim, porque senão ai sim, estará a cometer o assassinato do filho daquele pai. Dito isto, e sob pena de parecer que me estou a contrariar, eu sou, não a favor do aborto, mas sim a favor de que seja uma ferramenta disponível a ser usada, caso haja necessidade disso, e com o consenso de ambos os possíveis futuros pais. É preferível um bebé que não nasceu, a um que nasceu e que será morto cá fora, ou que será abandonado, ou maltratado e poderá vir a ser um marginal. Falando friamente devo dizer ser assim que funcionam os países de 1.º mundo, e é assim que também se combatem os números da criminalidade.
Ainda assim um aborto não pode ser feito de ânimo leve, nem pode ser vangloriando como se fosse um ritual de passagem, como vimos defender a tonta da Mafalda Matos, no Big Brother Famosos, que só faltava dizer que uma mulher que se prezasse deveria fazer um.
Julgo que o aborto tem que ser regulamentado e, mais uma vez, quem os faz deverá ser responsabilizado, caso seja uma práctica comum. Não estamos no séc.XIX, e hoje temos vários meios que permitem evitar gravidezes indesejadas, parte apenas, mais uma vez, daquilo que eu disse que a população não tem, consciência, e é por isso que existe a necessidade de haver quem nos guie.