Um dia de doidos
Pacotinhos de Noção
Saúde mental... Um tema em que é sempre preciso falar com cuidado porque há sempre alguém que teve, tem, terá ou é maluco, e não suporta que se fale do assunto.
Logo neste parágrafo hão-de ter havido leitores que sentiram vontade de se insurgir por utilizar o adjectivo maluco, mas como é dessa ramificação específica da falta de saúde mental de que vou falar, então julgo que devo tratar os bois pelos nomes. No dicionário Priberam definem da seguinte forma:
MALUCO
(origem controversa) → TAL COMO EU DISSE
adjectivo e nome masculino
1. Que ou quem não tem o juízo todo; que ou quem perdeu a razão ou tem distúrbios mentais. = ADOIDADO, DOIDO, LOUCO
2. Maníaco; cismático.
3. Que ou quem é estouvado ou extravagante. = ESTROINA
Pois bem, e ontem foi um dia de trabalho cheio de malucos. Não vos vou contar as histórias especificamente, mas de facto foi um dia em que cada cliente que me aparecia, se não era fugido de um qualquer estabelecimento psiquiátrico, julgo que mais tarde ou mais cedo lá vai parar.
Tenho que admitir que não me sinto à vontade com malucos. Assustam-me pessoas que não dominam o seu discernimento mental, e que são instáveis. Poderá ser um preconceito da minha parte, afinal de contas todos terão o seu preconceito de estimação, e este pelos vistos é o meu, mas poderão vocês afiançar que alguém com um desequilíbrio, não pode num qualquer momento tentar tirar-me o olho com uma esferográfica? Nem sequer podem garantir-me que não serão vocês o agressor da BIC, quanto mais meter a mão no fogo por alguém que há partida já tem um problema do foro psicológico. É que estas questões da mente não são passíveis de diagnóstico prévio, e podem acontecer subitamente, sem sequer se saber qual foi o gatilho que tudo despoletou. E hoje foi assim, tive contacto com vários malucos, e ainda para mais malucos daqueles maus, que não se contentam em falar sozinhos ou em serem o Napoleão. Visitaram-me aqueles que têm distúrbios, e que querem à viva força desequilibrar as pessoas com quem contactam.
Malucos houve das mais variadas espécies. Uns são dos tais que precisam urgentemente de ser internados, e não brinco, são pessoas passivo-agressivas que sentem raiva até da própria sombra. São os que mais assustam mas também são os que mais facilmente nos deixam de pé atrás, tal é a atitude, sendo assim até mais fáceis de identificar.
Depois temos aqueles que não sendo agressivos gostam de moer a paciência ao próximo. Repetem uma situação até à exaustão, não conseguem compreender quando são inconvenientes, ou então conseguem, mas estão-se completamente nas tintas. São o tipo de pessoa que faz questão de soltar o seu valente traque vocal, dizendo o que querem, e quando mal o fazem, desaparecerem, deixando no ar o fétido cheiro por eles expelido. Bem sei que esta é uma analogia demasiado escatológica, mas é perfeita para emoldurar aquilo que acabei de dizer.
O facto de não me sentir à vontade com malucos tem dois condões. O primeiro é de que parece que sentem esta minha falha e aproximam-se automaticamente, como se eu estivesse magnetizado, o segundo é o de também eu passar por maluco, porque infelizmente não tenho aquele filtro que a maioria das pessoas tem, que é o de conseguir ignorar as conversas dos malucos. Às vezes dou por mim a responder-lhes e até a dar corda, corda essa com que me podem vir a enforcar.
Não será a coisa mais bonita de se dizer, mas acredito que quem é maluco tem que ser internado, tanto para sua segurança como para de todos os outros. Costumamos relativizar, mas quantas vezes há uma relativização que acaba num ataque num espaço público ou, como recentemente aconteceu nos E.U.A, numa escola cheia de crianças?
Os malucos que ontem me visitaram não posso afirmar serem loucos perigosos, mas conforme disse atrás, também não meto a mão no fogo por eles. Posso, isso sim, dizer que conseguiram transformar o meu dia num pequeno inferno. Não sei se foi uma conjunção de astros, se foram as areias africanas, ou a fase da lua, o que é certo é que já há muito tempo que não tinha que lidar com tanto maluco, desde aquele dia em que fiz uma visita de estudo à Assembleia da República.
Este tipo de patologias mentais incomodam-me, e até me assustam tanto, que devo dizer que não acho piadinha nenhuma quando existem pessoas que gostam de se afirmar como "uns grandas malucos" ou que "X é maluco, mas eu consigo ser mais maluco que ele".
Eu não sou maluco e não tenho orgulho nenhum se me confundirem com um. Não quero ser nem considero que os níveis de maluqueira possam ser correlacionados com o quão "fixe" se consegue ser. Gosto de ter consciência das minhas capacidades e faculdades mentais, e espero manter-me assim por muitos e longos anos, de preferência a vida toda. Se tal não acontecer, se começar a comer terra e a cal das paredes, então peço desde já que me internem, porque se eu não responder por mim, não estou à espera que alguém se prejudique e o faça.