Qual é o melhor dia para rezar, e sofrer enorme desgosto?
Pacotinhos de Noção
É 31 de Julho, porque depois entra Agosto, e começam as Jornadas Mundiais da Juventude.
Acho imensa piada recordar que, até há uns meses a comunicação social despejava quantidades industriais de notícias acerca dos crimes de pedofilia na Igreja portuguesa, os portugueses estavam muito indignados e queriam fazer uma nova Inquisição, mas agora aos antigos inquisidores. Ia haver cabeças cortadas e padres imolados pelo fogo.
Houve declarações vergonhosas, houve posições de altas figuras do Estado que quiseram proteger a Igreja, ainda que não o admitissem, mas regra geral alguém da Igreja teria que pagar.
Ora, houve aqui um qualquer engano porque entre o "alguém da Igreja tem que pagar" até ao "alguém tem que pagar à Igreja" vai uma grande distância, mas foi uma distância percorrida do dia para a noite.
Vamos todos pagar as Jornadas Mundiais da Juventude, sejamos crentes ou não. Vamos pagar e não é pouco, mas isso interessa pouco porque esqueçam os Coldplay, a Taylor Swift ou o Quim Barreiros, porque quem sabe fazer espectáculos é o Papa. E atenção que o homem está a cair de podre, se estivesse em plena forma, e dançasse a Macarena, havia de vir muito mais gente.
Está tudo eufórico. Lisboa vai parar, a função pública vai fazer ponte, há obras a decorrer para o Papa pensar que vem a um lugar onde tudo funciona bem, e até a cidade está a ser "desbaratizada" e os sem abrigos a ser varridos para os esgotos.
As televisões salivam e as notícias acerca das jornadas jorram com mais jactância que a fonte da água do Luso. Há peças sobre onde vai o Papa sentar o rabo, como veio o Papa Móvel, onde dorme o Papa, que roupa vai usar, o que vai comer, de onde é a porcelana da sanita que vai usar.
A comunicação social passou dos 8 aos 80 porque, entretanto, esqueceram os crimes cometidos. As vítimas continuam a ser vítimas, os agressores continuam a ser padres e catequistas, alguns até vão participar nas JMJ, mas aquilo que agora interessa é se vão vestir roupa feita com o burel da Serra da Estrela. Até neste caso a hipocrisia é elevada ao máximo, pois foram entrevistar um pastor serrano que utiliza o burel (um tipo de lá das ovelhas da Serra) para se aquecer enquanto trabalha. Um ser que, mesmo trabalhando, vive em condições próximas do miserável, mas a reportagem não falava sequer neste facto, perguntavam-lhe apenas se estava orgulhoso pelo facto de o tecido ser o escolhido para as roupas do Papa e de todo o clero, que vai estar no altar-palco. Ao homem pouco lhe importava, não ganhou nada com isso. Quem vai ganhar é uma empresa, criada para o efeito, que inventa um nome tipicamente lusitano tipo "Buriel Factory", que compra o tecido ao preço da chuva, e que depois vende a preço de milhão, apenas porque fez uma estampagem foleira e barata, mas há-de a empresa ter sido constituída pelo familiar de algum autarca, ou outro género de político
Resumindo, estamos todos muito contentes que vem cá o Papa. Esquecemos os problemas que diariamente nos afectam, mas isto nem sequer me deixa espantado. Somos o país de Fátima, Fado e Futebol, mas Fátima não serviu para receber o Papa, e por causa disso o Fado vai-se fazer sentir quando a factura tiver que ser paga, mas está tudo bem, porque depois recomeça o Futebol e entramos em letargia outra vez.